domingo, 26 de fevereiro de 2012

A ORAÇÃO DO SENHOR - BENTO XVI

O Sermão da Montanha esboça um quadro envolvente do modo correto de ser homem. Quer mostrar-nos como é que se faz para ser homem. A sua visão fundamental poderia resumir-se na afirmação: o homem só se entende a partir de Deus e só quando vive na relação com Deus é que a sua vida é correta. Mas Deus não é um distante desconhecido. Em Jesus, Ele nos mostra o seu rosto; no Seu agir e na Sua vontade, conhecemos os pensamentos e a vontade de Deus.


Se ser homem significa essencialmente esta relação com Deus, então se torna claro que isso engloba falar com Deus e escutá-lo. Por isso pertence também ao Sermão da Montanha uma doutrina sobre a oração; o Senhor nos diz como é que devemos rezar.


Em S. Mateus, uma curta catequese sobre a oração precede a oração do Senhor, a qual quer sobretudo nos precaver contra as formas falsas de oração. A oração não deve ser exposição perante os homens; ela exige discrição, que é essencial para uma relação de amor. Deus dirige-se a cada um individualmente com o seu próprio nome, que aliás ninguém conhece, diz-nos a Escritura (Ap 2, 17). O amor de Deus por cada um é totalmente pessoal e traz em si este mistério da unicidade, que não deve ser divulgado aos homens.


[...] A outra falsa forma de oração, contra a qual o Senhor nos adverte, é a tagarelice, o palavreado, que asfixia o espírito. Todos nós conhecemos o perigo de repetir formas habituais e termos ao mesmo tempo o espírito totalmente longe. Estamos mais atentos quando, a partir de uma necessidade mais profunda, pedimos a Deus algo ou lhe agradecemos, de coração feliz, algum benefício experimentado. Mas o mais importante é - para além destas situações pontuais - que a relação com Deus esteja presente no mais íntimo do nosso ser.


Havemos de rezar tanto melhor quanto mais a orientação para Deus estiver no mais íntimo da nossa alma. Quanto mais ela for a razão que leva em si toda a nossa existência, tanto mais havemos de ser homens da paz. Tanto mais poderemos suportar a dor, tanto mais poderemos compreender os outros e estar abertos para eles. Esta orientação que impregna toda a nossa consciência, a presença silenciosa de Deus na base do nosso pensamento, da nossa reflexão e do nosso ser, é tudo isso que chamamos de "oração permanente".


Esta autêntica oração, a presença interior e silenciosa de Deus, precisa de alimento,  e é para isso que serve a oração concreta, com palavras ou representações ou pensamentos. Quanto mais Deus estiver em nós, tanto mais poderemos nós estar realmente com Ele nas várias formas de oração. Mas vale igualmente o inverso: que a oração ativa realiza e aprofunda o nosso estar com Deus. Esta oração pode, e deve, subir antes de tudo ao que diz o nosso coração, às nossas necessidades, esperanças, alegrias e sofrimentos, à vergonha pelos pecados bem como ao agradecimento pelo bem, e assim ser uma oração totalmente pessoal.


Fragmento do livro: Jesus de Nazaré.

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